Uma reportagem bem legal que achei no jornal portugues "Expresso" escrita por Rui Cardoso.
Granizo e frio glacial dificultam testes da Fórmula 1 no Algarve
"Nestas condições isto parece mais todo-o-terreno que Fórmula 1". Era o desabafo que mais se ouvia esta manhã no autódromo do Algarve, à medida que técnicos, pilotos e jornalistas iam chegando ao circuito, entre Alvor e Odeáxare.
Estava frio, chovia - uma chuva que, às vezes se transformava em granizo - e soprava um vento moderado. À passagem pela recta da meta, os carros levantavam uma poalha impressionante, misto de nevoeiro e chuva, mesmo quando rodavam durante os curtos períodos de acalmia do tempo.
"Está demasiado frio para se poderem testar devidamente os pneus e pouco haverá a aprender com estes testes", dissera na véspera, ao jantar, Jarno Trulli, piloto principal da Toyota. A previsão cumpriu-se e o piloto italiano fez apenas algumas voltas de reconhecimento, ainda a adaptar-se a um carro onde se sentava pela primeira vez.
As coisas não foram muito diferentes para as restantes equipas presentes no Algarve, nomeadamente McLaren, Renault, Williams ou Red Bull, sendo que esta última utilizava, ainda, o modelo da época passada. A Ferrari também esteve para vir mas, à última hora, desmarcou tudo por causa do mau tempo. Foi para Itália, noutra pista onde, segundo constava aqui, também chovia a potes...
Corridas mais competitivas?
O novo carro da Toyota, com a asa frontal mais larga e cuja posição pode ser alterada pelo piloto em corrida
"Este ano, os carros apresentam diferenças importantes relativamente ao ano passado. O apoio aerodinâmico traseiro foi reduzido e regressou-se aos pneus lisos (slicks) quando não chove. O regime máximo foi reduzido das 19 para as 18.000 rotações por minuto e cada motor terá de durar três corridas, sob pena de penalização.
Os pilotos passam a poder recorrer a um reforço da potência (mais 80 cavalos a juntar aos mais de 740 disponíveis), por exemplo, para ultrapassar. Mas, em contrapartida, o controlo electrónico de tracção foi abolido, tornando mais difícil pôr toda aquela potência no chão.
Para dar ainda mais opções, a asa frontal, mais larga que a do ano passado e que chega à largura das rodas, pode ser afinada pelo piloto durante a corrida. Isso permite-lhe, por exemplo, reduzir ou tirar apoio frontal para reagir a situações, tais como rodar no cone de aspiração do carro da frente. Mas o regulamento apenas o permite uma vez por volta, E a telemetria, qual 'Big Brother' lá está, omnipresente, para verificar, aplaudir ou punir...
Teremos Grandes Prémios menos monótonos? Essa é a convicção dos responsáveis da Toyota, a cujo convite o Expresso viajou para o Algarve. "Nestes últimos anos, a posição na grelha de partida praticamente determinava o resultado final, salvo falha mecânica ou acidente, quem largava à frente, chegava à frente. Havia muito pouca ultrapassagem. Agora, um piloto hábil poderá ter muito mais hipóteses de ganhar ou recuperar lugares". Esta a tese de Jens Marquart, novo director da equipa, que espera ver os seus carros "disputar muitas vezes o pódio, na nova época". Isto porque, "fiáveis já provámos que somos. Agora vamos mostrar que também somos rápidos".
Jano Trulli, piloto principal que terá como companheiro de equipa Timo Glock, espera dar à marca "a primeira vitória de sempre". Trulli que joga futebol nas horas livres, é produtor de vinhos nos Abruzzos (costa adriática de Itália) e tem como negócio complementar o fabrico de 'chassis' para karts (foi campeão do mundo, no começo da sua carreira). Chegou ao Algarve sem conhecer nem o carro nem a pista, mas isso não pareceu afectar a sua boa disposição.
Já o piloto de testes, Kamui Kobayashy, não poupou elogios à pista. "Das melhores onde tenho estado, com muita condução, subidas e descidas, permitindo testar muita coisa no carro". Fez 46 voltas ao longo de dois dias de testes e ensaiou diferentes configurações do traçado, umas mais lentas e outras mais sinuosas. Para ele, que já conhecia Portugal por ter estado no Estoril aos 18 anos, "só é pena os carros ainda terem tanta ajuda electrónica"...
Electrónica é, de facto, coisa que não falta por aqui. Cada camião-escritório de equipa tem uma portentosa antena que se eleva a mais de 20 m de altura. Em cada instante o comportamento do carro em pista é seguido nas boxes. Os vários parâmetros são registados e gravados e tudo é enviado para a fábrica para análise posterior.
O interior destes camiões é verdadeiramente impressionante no que respeita a limpeza e arrumação. Num toque tipicamente japonês, as ferramentas e o material são arrumados pela mesma ordem e no mesmo sítio que na fábrica, como explicou Guy Bassin, responsável pelas relações públicas da marca japonesa. "Quem me dera que estes gajos fossem a minha casa e me organizassem tudo assim", desabafava, fascinado, um dos nossos camaradas de profissão.
Aqui, no Autódromo do Algarve, havia uma média de meia-dúzia de camiões por equipa, mais os da Bridgestone, fornecedora oficial dos três tipos de pneus (molhado, muito chuva e seco) que todas as formações usarão este ano. Mas num Grande Prémio poderão subir para o dobro. No caso de Michael Schumacher, que era fanático da forma física, juntava-se, ainda um camião-ginásio, equipado com toda a palamenta, para seu gozo pessoal.
30 milhões para o regresso da F1
Jens Marquart não poupou elogios ao traçado algarvio e, tanto ele como Kobayashy consideraram-no "digno de um Grande Prémio". Entre o desejo e a realidade interpõem-se, pelo menos 30 milhões de euros. Uma verba que talvez se torne aliciante para o Governo de José Sócrates se lhe recordarem que um carro de Fórmula Um anda, pelo menos, tão depressa como o TGV..."